quarta-feira, 7 de outubro de 2009

36 - O buraco do ozono

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Fotografia de um sinal com o aspecto característico do melanoma cutâneo.

O Paulo Santiago vela pela nossa saúde. Exerce as funções de agente sanitário na área das carnes verdes, ou mais simplesmente, inspecciona as carcaças dos animais abatidos procurando indícios de patologias que tornem essas carnes impróprias para consumo humano.
Há dias, em sua casa, enquanto nos deliciávamos com um belo leitãozinho assado, pedi-lhe que nos explicasse em que é que consistia o seu trabalho, quais os métodos inspectivos que utilizava, as doenças mais frequentes detectadas e, no caso das rejeições, como e onde eram destruídas as carcaças. O Paulo lá foi correspondendo pacientemente à nossa curiosidade de maneira que ninguém ficasse com dúvidas relativamente à segurança da chicha que hoje em dia se manduca no nosso país. Mas…

Eis o teor do mail que me enviou no dia seguinte:

“…Ontem, na conversa sobre inspecção sanitária, esqueci-me de uma doença,
ultimamente muito frequente, o melanoma, que dá origem à rejeição total da carcaça. Estes melanomas são mais frequentes em leitões oriundos de explorações situadas no Alentejo ou em Espanha, onde são criados ao ar livre. Hoje, e por isso me lembrei da conversa, apareceram-me na linha dois porcos adultos de raça ibérica, o vulgar porco preto apresentando um ou vários sinais, de cor negra, rugosos. Raspando com a faca libertam um pigmento negro, e os gânglios inguinais ou sub-maxilares, quando cortados, também apresentam pigmentação negra.
Todas as semanas são eliminadas várias carcaças de leitões, o que não acontecia em anos anteriores, quando a grande maioria dos animais provinha de suiniculturas de circuito fechado.
Não há protector solar para os porcos…!”

Viajar, implica muitas vezes expormo-nos ao sol inclemente como acontece em certas regiões dos trópicos. Mesmo em climas temperados como aquele que impera na maior parte do território europeu, quem não abusou já de doses massivas de raios solares, numa ida à praia ou até na própria varanda do prédio onde reside?
De facto, todos temos consciência que este é um comportamento de alto risco para a saúde e ninguém pode alegar ignorância já que as campanhas de sensibilização para os perigos da exposição solar excessiva têm sido mais do que muitas.
Certamente, o meu caro visitante já ouviu falar no melanoma maligno ou cancro da pele. Trata-se de uma doença muitas vezes letal se não for diagnosticada no estadio inicial do seu desenvolvimento. Entre nós a sua incidência é de cerca de 700 (novos) casos /ano.
Pode aparecer numa zona de pele até então sã, sendo mais frequente o caso de um sinal preexistente que em dado momento degenera. Estes sinais, raros nos indivíduos de raça negra, podem ser mais ou menos planos ou nodulares, variando a sua cor entre o rosa e o castanho-escuro. O que chama a atenção e deve ser considerado toque a rebate, é o seu crescimento brusco, assim como a alteração da cor e morfologia dos bordos que se tornam proeminentes e irregulares, a rugosidade e o aparecimento de grumos negros no seu interior, cursando geralmente com desconforto, prurido (comichão) ou dor. Trata-se portanto de um tumor da pele com origem na multiplicação descontrolada de células localizadas sob a epiderme chamadas melanócitos. Estas células produzem uma substância escura chamada melanina, responsável pela coloração natural da pele e que funciona como escudo protector, absorvendo os raios ultravioletas da luz solar. Quando nos expomos ao sol com o intuito de obter aquele bronze de fazer inveja aos amigos, o que estamos a fazer é excitar os melanócitos para que produzam mais melanina que ao disseminar-se na camada superficial da epiderme, lhe confere um tom mais escuro. Porém, se essa estimulação for excessiva, sobretudo com os raios UV mais penetrantes, incidindo perpendicularmente sobre a pele nas horas do meio do dia, o resultado pode ser o desastre, pois podem surgir mutações no ADN dos melanócitos conferindo-lhes características oncológicas. Surgem então ninhos de células com grandes núcleos e elevada taxa de mitoses e a partir daí, nada trava a sua multiplicação se o diagnóstico e tratamento não forem instituídos oportunamente. A disseminação loco-regional é rápida e as correntes sanguínea e linfática não tardam em ser atingidas. As células malignas que não forem captadas e destruídas pelas defesas linfáticas (gânglios), podem colonizar o fígado, os pulmões ou o cérebro, dando origem às chamadas metástases do tumor primário localizado na pele.
Do que atrás foi dito, duas coisas não podemos concluir:
1ª - Banhos de sol fazem mal.
Não é verdade, a luz solar tem efeitos benéficos sobre o nosso psiquismo, promove a remissão de certas doenças como por ex. a psoríase e cataliza a síntese de vitamina D pela pele.
O que é imperativo é que cada um use a protecção adequada ao seu tipo de pele e evite a exposição quando o sol está a pique. Solários, nunca!
2ª - Quem tiver um sinal feio, está condenado.
Nada mais longe da verdade, também. Sinais de aspecto preocupante podem não representar qualquer perigo para a saúde ou a vida. E mesmo quando temos um diagnóstico seguro de melanoma, a cirurgia atempada coadjuvada por outras terapêuticas cada vez mais avançadas, permite erradicar completamente o problema.
O que é preciso é estar atento a qualquer sinal que apareça de novo com características suspeitas e vigiar lesões pré existentes, procurando alterações como as anteriormente descritas. E sempre, mas sempre, em todo e qualquer caso, pedir ao médico de família que observe!
A terminar, quero deixar uma nota à observação do Paulo quando diz que não há protector solar para os porcos. Meu caro, os animais quando crescem em liberdade na Natureza, sabem como prevenir certas doenças. Os filmes da BBC vida selvagem, National Geographic e outros, mostram-nos como os bichos bravios procuram as sombras nas horas de maior calor. Além disso, os de pele quase glabra como os porcos, chafurdam nos charcos de modo a cobrirem o corpo com o seu protector preferido, a lama.
Infelizmente, os humanos já causaram demasiados danos ao ambiente e ainda que neste momento se arrepiasse caminho, seria necessário o tempo de várias gerações para a sua recuperação.
Um dos estragos mais bem estudados é o do já famoso buraco do ozono. O ozono é um gás existente na estratosfera, muito rarefeito e instável, constituído por três átomos de oxigénio (O3). A radiação UV, ao quebrar as ligações do oxigénio molecular (O2), liberta dois átomos cada um dos quais vai por sua vez colidir com uma molécula de O2 dando origem ao oxigénio triatómico. Deve-se a este gás a existência de vida na Terra, pois actua como um filtro dos UV que fazem parte do espectro solar. Se atravessasse livremente a nossa atmosfera, essa radiação esterilizaria a superfície do planeta.
Mas a produção industrial do séc. XX usou e abusou de compostos como os CFC’s, mas também do cloro gasoso e do bromo que interferem com o ciclo do O2 «--» O3 criando zonas sem protecção ou buracos, sendo um dos mais importantes o que se situa sobre a Austrália.
A nossa situação não é tão grave, mas é-o o suficiente para que alguns dos leitões do Paulo, criados ao ar livre, vão para o lixo. O que é uma grande pena, sem dúvida!

Juan

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